PEDRO CHORÃO - INQUIETAÇÃO
26/08/2019
A exposição “Pedro Chorão – desenhos” expõe sessenta e seis longos passos sobre um caminho coerente e astuto. Uma viagem que constrói um imaginário edificado nas suas origens beirãs e na experiência posterior entre Lisboa, Marrocos e Goa. A transparência desta narrativa é manifestamente evidente, contudo camuflada, em fase mais tardia, sobre caligrafias que se desenham sobre texturas e rendilhados de cores. É aqui que residente a verdadeira natureza de Pedro Chorão, o pintor.
A delicadeza do traço de Pedro Chorão nos excertos figurativos sobre desenquadramentos espaciais, evoca de modo pueril, fragmentos da sua juventude. Uma memorialística sobre as suas raízes! Por outro lado as referências aos equilíbrios de Dourdill conjugados com a áurea de Morandi permitem desvendar, mais tarde, um academismo consistente e fundamentado sobre o chapéu de Rocha de Sousa. Os exercícios entre colagens e papel impresso com acrílicos e grafite,adensam este sentido cronológico numa extensa repetição de clarividência sobre a sua realidade. Nesta fase, a energia circular de eterno retorno à essência, permite aprisionar os desejos no suporte onde a tridimensionalidade teima em se construir no gesto! Talvez se entenda aqui, neste passo largo, a sua natureza!
O caminho é longo e largo...
Sobre um slow motion que se consubstancia sobre frames de viagens, Pedro Chorão retoma o seu caminho nas leituras de Paul Klee onde as Water Pyramids se adensam no sonho. A densidade do espaço é crescente a cada passo e as águas cada vez menos turvas. A delicadeza do papel é inerte à “violência” do acrílico, apesar das direcções da grafite. Este sentido de equilíbrio terreno permite aflorar o retorno ao espaço onde a escala é pêndulo de ouro. São os compromissos que permitem que a sequência persista para alem das partes. A vibração dos volumes em conjunto com as cores de uma outra realidade, produz uma perspectiva sobre layers temporais. Neste jogo de transparências, de sobreposições, de dramatologia, Pedro Chorão evoca um espaço - tempo metafísico profundo que nos permite caminhar para além da sua realidade! Uma peregrinação distinta, estereoscópica.
...exaltação...
Mar revolto, a oriente nada de novo... tudo! Os azuis, os azuis... os azuis! Um turbilhão de vontades entre brancos, brancos-cinzas e cinzas-brancos, onde o suporte participa como nunca nesta comunhão de crenças. Pedro Chorão, demonstra vitalidade sobre um manto de caligrafias indecifráveis. É na sobreposição de cores, na força do movimento que as atmosferas são pretextos para o diálogo, do “GRIS” ou do BLUE. É neste exercício de sinais pintados que se inscrevem sobre manchas também elas pintadas, que Pedro Chorão escreve um manifesto à pintura. A melodia é cada vez mais intensa e entendida. Desta feita não fora um passo, mas um salto para além do horizonte. Se antes caminhará para além do ser, agora procura entender o mundo.
muros...
O marfim foi deixado para lá das costas e a consciência passou a habitar o papel. Pedro Chorão abriga-se na ortogonalidade e nos cinzas fortes. Contudo não procurou refúgio nas choças beirãs, o betão ganhou expressão e aprisiona agora o visitante. É neste lugar, para além do muro, que ele procura o sentido do eterno retorno. No conforto da composição, representa o espaço e o indivíduo em uníssono, um grito de quotidiano, uma contemplação experienciada.
O habitar é cada vez mais evidente. A abstracção glorificou-se no espaço e o traço deixou de ser veiculo. O papel trespassou definitivamente a realidade e o desenho, nestes sessenta e seis passos, é a sua síntese, a sua inquietação...