A propósito da exposição No meio da pedra tinha um caminho de Pollyana Freire na Galeria Bessa Pereira
Ensaio sobre a fronteira...
18/05/2023
O conjunto das “experimentações” que agora se apresentam pelo traço da Pollyanna Freire, são ensaios com uma escala que nos permitem interpretar a verdadeira natureza do seu pensamento. A escala reduzida, alicerça o seu processo gráfico, assumindo-se como um meio de mediação entre a dimensão da folha de papel e a escala urbana, que um dia a sua obra configurará com certeza.
Aparentemente, o desenho é fundamental na estruturação do caminho entre pensamento e a existência das peças, contudo, acreditamos que os exercícios de construção em escala reduzida permitem-lhe incorporar o objecto e estabelecer um diálogo entre peças, mas acima de tudo, incutir-lhes referenciação espacial mesmo quando isoladas. A concepção é metódica e estruturada, e nessa medida as peças que servem de consolidação do processo, por incorporarem a objectividade e definição conceptual de Pollyanna, permitem, a outra escala, identificar universos paralelos com a mesma substância. À imagem da circunstância dos habitantes da Ilha de Liliput. Se a nossa relação com a dimensão “menor” das peças não produz menos efectividade na expressão das mesmas, pelo contrário, revela um robusto eclectismo na constituição de novos universos (mesmo que a uma escala doméstica).
A expressão da sua obra, traduz-se no desenho de uma bidimensionalidade ficcionada sobre o infinito, permitindo-nos a nós, caminhar na vertigem sobre o limite do que será o “outro lado do espelho”. Uma fronteira invisível entre a realidade e o vazio, onde o desenho é quem traça a iminência. Tal como João Pinharanda afirma, as suas peças “são apreendidas visualmente como se estivéssemos a vê-las serem desenhadas no espaço”, sendo o movimento do observador o rastilho na sua interpretação. A imobilidade é ficcionada entre arestas, planos e sombras, concretizando perenes vazios nos seus núcleos, contudo o movimento de interpretação pelo espectador torna-se motor na activação do objecto perante a sua depurada envolvência. Neste duplo movimento em torno e através dos vazios, construímos a cartografia da “dança” entre peças, harmonizando com o nosso movimento a polifonia entre delicadas estruturas cromaticamente distintas.
O domínio cromático entre peças, a reinterpretação do espaço através do movimento cru do traço e a flexibilidade das peças na transição entre escalas consubstanciam a expressão de um movimento elíptico na construção de novas formas sobre o vazio. A subtileza deste confronto é profundamente reveladora da singularidade da obra de Pollyanna.